quarta-feira, 20 de junho de 2007

A fada trapalhona (texto: Cristina Mateus/ ilustraçoes:Aida Silva)


As fadas são como as pessoas. Nascem, crescem, vão para à escola e um dia, quando são muito, muito velhinhas morrem.
Lília era uma fada com muitos, muitos anos e ensinava as fadas mais novas a compreenderem o mundo, a natureza, as pessoas e as coisas. Todas as outras fadas tinham muito respeito e admiração por Lília, porque ela sabia sempre a solução de todos os problemas e era uma óptima professora pois tinha muita paciência até com as mais novas , mesmo quando estas faziam alguma traquinice.


Quando estava bom tempo, ela e todas as fadas voavam sobre as florestas, os rios, as cidades e os campos cultivados. Ensinava-lhes o nome das árvores, das plantas, das flores, dos rios, das cidades, das ruas, das aldeias, das meninas e dos meninos.
Quando chovia sentavam-se debaixo das pétalas das flores ou dos cogumelos e aprendiam a escrever, a ler e a contar. Sempre que a chuva diminuía e o sol começava a espreitar iam procurar o arco-íris e com ele aprendiam as cores.


Elas também aprendiam a distinguir uma fada de uma bruxa e sabiam quais eram os disfarces que as bruxas utilizavam para fazer mal às fadas.
As fadas aprendiam muito depressa e quando já conheciam todas as coisas e sabiam espalhar a bondade e a alegria no coração dos homens, era-lhes dada uma varinha mágica. Assim já podiam ajudar as pessoas e os animais sozinhas.

Num lindo dia de Primavera foi a vez da fada Janina receber a varinha de condão. Foi a própria fada Lília que lha entregou. Janina era a fada mais inteligente e bondosa de toda a escola e por isso foi incumbida de ensinar às outras fadas tudo o que elas precisavam de saber sobre as cidades.Janina levou para casa uma caixa enorme cheia de garrafinhas pequenas. Em cada garrafa estavam as letras do nome de cada cidade e três flores. As flores significavam o passado, o presente e o futuro de cada cidade e nunca murchavam.Quando chegou a sua casa, guardou a caixa no cimo de um armário para que a sua irmã mais nova, a fada Soraia, não conseguisse chegar lá e para evitar que ela partisse alguma garrafa.

Durante muitos, muito anos Janina ensinou tudo o que sabia sobre as cidades e sempre que havia alguma cidade nova, Janina levava mais uma garrafinha para a caixa. Ao mesmo tempo, a sua irmã Soraia foi crescendo mas nem parecia uma fada. Era antipática e malcriada. Não queria ir para a escola e quando ia estava sempre desatenta e a pregar partidas às outras fadas. Por isso, ninguém ficou surpreendido quando todas as fadas da sua idade receberam a varinha mágica e ela não, pois ainda mal sabia o nome das coisas e não sabia ler nem escrever.
Muito revoltada Soraia fugiu e voou durante muitos dias para muito longe. Quando já estava cansada resolveu sentar-se à sombra de um malmequer e pouco depois adormeceu.

Quando acordou estava ao seu lado um lindo pássaro colorido, que era uma bruxa disfarçada, e lhe perguntou o que estava ali a fazer. Soraia mentindo respondeu que tinha sido expulsa do reino das fadas e que todas as outras fadas eram más para ela. O pássaro voou para o seu ombro e perguntou-lhe se ela era uma fada, porque não tinha uma varinha mágica. A fada respondeu que também lhe tinham tirado a varinha mágica e que sem ela tinha poucos poderes.



A bruxa pensava que era verdade e como queria entrar no reino das fadas para roubar a inteligência da sábia Lília e acabar com a bondade das fadas, tentou convencer a fada Soraia a voltar. A princípio ela não quis, mas quando o passarinho lhe disse que a ajudava a ter de volta a sua varinha mágica ela aceitou. Assim, a bruxa malvada e a fada mentirosa voltaram para o reino das fadas que ficava num lindo jardim debaixo de um carvalho enorme. Quando já estavam perto, o passarinho escondeu-se no bolso do vestido da fada para não ser visto.


As fadas andavam todas muito aflitas atrás da fada Soraia e quando a viram ficaram muito contentes por saberem que ela estava bem. Perguntaram-lhe onde tinha estado e ela disse que se perdeu quando ia procurar borboletas, que são as melhores amigas das fadas.






Ela foi tão convincente que todas acreditaram nela e Janina levou-a para casa.
Iam a conversar pelo caminho quando Soraia tropeçou e caiu. O pássaro que estava no seu bolso saiu a voar muito depressa e de repente a bruxa voltou à sua forma normal. Soraia, sem perceber o que se estava a passar ficou pasmada a olhar para ela. Enquanto isso, Janina que era uma fada muito boa e muito inteligente, percebendo que o pássaro era uma bruxa disfarçada, pegou na sua varinha mágica e enfeitiçou a bruxa, transformando-a numa linda roseira, porque as bruxas detestam tudo o que é bom e belo.






Só nessa altura é que a fada Soraia percebeu o que se estava a passar e então começou a chorar, muito arrependida. Contudo, o conselho das fadas reuniu-se e decidiu que ela deveria ser castigada. Soraia ficou obrigada a ir sempre à escola, a prestar atenção nas aulas e foi proibida de sair do reino das fadas.


Durante alguns meses, ela cumpriu, indo à escola, aprendendo e portando-se bem, mas a pouco e pouco foi deixando de estar atenta na escola, voltou a atrasar-se nas lições e a pregar partidas. Então, já cansada das suas traquinices e do seu mau feitio, Janina, proibiu-a de sair de casa, para que não perturbasse todas as outras fadas.

Um dia em que estava sozinha, Soraia lembrou-se da caixa das garrafinhas. Foi procurá-la e encontrou-a no cimo de um armário. Estava muito maior do que da última vez que a tinha visto, já havia muito mais cidades. Foi buscar um banco e como mesmo assim não conseguia chegar-lhe, desceu e foi buscar outro banco. Colocou-o em cima do primeiro e subiu com alguma dificuldade.
Quando se pôs de pé ficou fascinada com o que via. No interior da caixa estavam imensas garrafinhas pequenas que continham cada uma três flores e várias letras. Soraia não sabia o que eram letras, qual o seu significado, nem porque estavam ali as flores.

Muito curiosa pegou numa das garrafas que estava mais à ponta, e começou a observá-la com atenção. As letras mexiam-se, gritavam e pareciam muito assustadas por vê-la. A fada Soraia deu uma gargalhada e quando ia colocar aquela garrafa na caixa para pegar noutra, desequilibrou-se e caiu.
Por sorte não se aleijou, mas a garrafa que estava na sua mão, voou pelo ar, bateu com força no parapeito da janela aberta que estava ali ao lado e partiu-se em mil bocadinhos. As letras desapareceram e as flores misturaram-se com todas as flores do jardim.


Muito aflita, Soraia endireitou os bancos e foi colocá-los ao pé da mesa. Depois procurou sem descanso as letras, mas elas tinham fugido com muito medo, então decidiu ir ao jardim para tentar encontrar as flores, mas havia tantas iguais que ela não sabia quais eram as da garrafa. Desesperada voltou para casa e pegou num livro para que quando a irmã chegasse, pensasse que ela estava a estudar.



Ao fim da tarde, Janina voltou para casa. Ficou muito admirada de ver a irmã estudar e pensou que finalmente ela tinha ganho juízo. Trazia mais uma garrafinha para colocar na caixa, e assim que olhou para dentro dela, deu logo pela falta de uma. Janina conhecia muito bem todas as garrafinhas e sabia distingui-las como ninguém, por isso soube logo que a garrafinha que faltava era a da cidade de Trofa. Correu a perguntar à irmã pela garrafa, onde é que a tinha escondido. Soraia ainda disse que não tinha mexido em nada, mas ao ver a cara furiosa da irmã disse que uma das garrafinhas tinha saltado lá de cima e se tinha ido embora sozinha.
Janina sabia muito bem que as garrafinhas não se mexiam sozinhas e por isso exigiu que lhe contasse a verdade.
Muito envergonhada a fada Soraia contou que tinha pegado numa garrafinha e que a tinha deixado cair. Disse que já havia procurado pelas letras e pelas flores e que não as tinha encontrado.
Foram avisadas todas as fadas para que ajudassem a procurar. Durante horas procurou-se em todo o jardim e dentro de casa, mas nem sinal das letras nem das flores.


Em todo o país estava instalado o caos. Os jornais e as televisões só falavam do insólito desaparecimento da cidade de Trofa. No seu lugar havia apenas árvores e arbustos e só o Rio Ave continuava o seu percurso diário.
O conselho das fadas reuniu-se de emergência, mas desta vez, nem a sábia Lília sabia como resolver o problema, porque nunca antes se tinha partido nenhuma garrafa pois todas as fadas eram muito cuidadosas.
Decidiu-se que a fada Soraia deveria ser expulsa para sempre do reino das fadas.

Muito triste e zangada consigo própria ela decidiu que haveria de encontrar uma solução.
Durante muitos anos viveu sozinha numa casa muito pequenina debaixo das folhas de um pequeno arbusto e todos os dias se levantava muito cedo para ir aprender sobre as coisas da natureza, dos animais e das pessoas. Ao fim de muito tempo ela já sabia tanto como a própria Janina e decidiu voltar.
Contudo não foi bem recebida e as fadas disseram-lhe que só seria aceite se conseguisse encontrar as letras da cidade de Trofa e as flores que simbolozavam o seu passado, o presente e o futuro.


Muito triste e muito, muito arrependida de tudo quanto tinha feito desde que era pequenina, a fada Soraia voltou para casa a chorar. Quando chegou, estava à sua porta a Doriza, a fada das fadas. Ao todo o seu arrependimento e toda a bondade que tinha o seu coração, disse-lhe a solução do problema. As letras estavam escondidas no livro mágico de Lília. Deveria abri-lo com muito cuidado e sorrir-lhes pois agora elas já não teriam medo dela por verem nela tanta bondade. As flores que simbolizavam o passado, o presente e o futuro da cidade de Trofa eram as primeiras que desabrochassem na Primavera seguinte.



Muito contente, a fada Soraia voltou para o reino das fadas e fez como Doriza, lhe dissera.
Na Primavera seguinte tudo voltou ao normal e a fada Soraia recebeu finalmente a sua varinha mágica e com ela encantou todos os homens para que não se lembrassem do desaparecimento da cidade de Trofa.

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